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Sono do Bebê

Quando o bebê vai dormir a noite inteira? Esse é o sonho de consumo das mamães e papais que experimentam uma vida de zumbis enquanto o pequeno não regulariza o sono da madrugada. Não preciso nem dizer o quanto isso impacta na qualidade de vida da família, não é? Não existem soluções mágicas como as vendidas pelas propagandas de cursos populares na internet, mas sim, existem formas de ajudar esse bebê a ter o melhor sono possível.

Para começo de conversa, precisamos entender bem como funciona o sono nessa idade e o quão diferente é do adulto, então vamos aos conceitos importantes:

O sono se divide em fases como ondas, você deve conhecer pelos nomes de Sono REM (rapid eye moviments, do inglês, “movimentos rápidos dos olhos”; sono superficial, dos “sonhos”) e Não-REM (profundo). Durante uma noite de sono temos vários ciclos de sono, na transição entre eles temos um breve despertar e o nosso cérebro checa se está tudo certo (ausência de perigo e necessidades atendidas), caso esteja, voltamos a dormir e na maior parte das vezes nem percebemos que despertamos.

 Os ciclos de sono do adulto tendem a ser mais longos, com cerca de 90-120 minutos, já os do bebê duram em média 50 minutos. Como os bebês não conseguem atender suas necessidades sozinhos (fralda suja, fome, presença do cuidador), isso pode gerar despertares bem frequentes nos primeiros meses, principalmente no período da exterogestação – primeiros 3 meses de vida – quando o bebê está se familiarizando com o ambiente fora do útero e precisa de mais aconchego para se sentir relaxado e conseguir dormir.

Outro ponto importante, e difere do sono do adulto, é que o bebê fica a maioria do tempo em sono mais superficial, em média 30 minutos dos 50 do ciclo, isso pode ser responsável por despertares quando é tirado da sua zona de conforto – colocado no berço, tirado do colo ou alguém faz barulho.

Analisando o sono por faixa etária, começamos pelo recém-nascido que tem um padrão próprio de sono e vigília, não sendo capaz de conseguir diferenciar dia e noite. O que significa que o sono e o despertar relacionam-se à fome e ao desconforto, e não à presença/ausência da luz, com períodos de sono durando entre 3 a 4 horas, alternados com 50 a 60 minutos de vigília. No recém-nascido, cerca de 55-60% do total do sono fica no sono superficial.

Entre o terceiro e o quarto mês de vida, temos o início da consolidação do sono com um padrão mais próximo (não igual) ao do adulto através da produção de melatonina (hormônio indutor do sono) e o sono começa a iniciar pelo sono profundo e ter uma pressão maior de sono ligada ao ritmo circadiano (presença/ausência de luz).

Daqui por diante, o bebê pode ter mais facilidade para pegar no sono, prolongar o sono e tende a ter menos despertares por conseguir emendar um ciclo no outro ou ter despertares mais breves, voltando a dormir rápido pela pressão de sono. Ao final do primeiro ano de vida, o sono NREM (profundo) domina cerca de 70% do total de sono, despertares noturnos ainda podem ocorrer, assim como sonecas diurnas.

Vejamos a recomendação de sono por faixa etária de acordo com a National Sleep Foundation (sono noturno + todas as sonecas do dia):

Janelas de sono:

Perceba que quanto mais novo o bebê, mais tempo total de sono ele precisa, assim como mais sonecas ao longo do dia, pois ele não tolera muito tempo acordado. É como se a “bateria” descarregasse mais rápido e ele precisa de várias pequenas recargas durante o dia para conseguir “funcionar” até o horário do sono noturno. E daí vem o conceito de janela de sono.

O tempo em que seu bebê permanece acordado e disposto, entre uma soneca e outra, é a sua janela de sono. 

E por isso, é importante que os cuidadores consigam identificar os sinais de sono de maneira precoce para sinalizar ao bebê que é hora de recarregar a bateria. Os principais sinais de sono costumam ser:

  • Coçar os olhos;
  • Puxar as orelhas;
  • Sobrancelhas e olhos vermelhos;
  • Olhar fixo e baixo;
  • Perde o interesse social;

Quando perdemos esses primeiros sinais, o bebê vai sinalizar chorando e ficando irritado. O problema é que nesse momento, ele pode ter dificuldade para relaxar e dormir, devido seu nível de estresse alto. É o que se conhece pelo termo de “efeito vulcânico”. Sim, seu bebê vira um vulcão em erupção após muita pressão de sono. Quem já passou por isso vai achar o termo bem apropriado à experiência. Isso é bem comum de acontecer no final do dia, “hora da bruxa”, outro ótimo termo, e muita gente confunde isso com cólica.

Como identificar a janela de sono do meu filho?

Existem algumas tabelas, mas diferente da tabela acima que foi elaborada por uma instituição de pesquisa respeitada sobre o sono, as tabelas encontradas na internet recomendando janelas de sono não são embasadas pela ciência, mas são resultados de observações variáveis. E a grande dificuldade de se estabelecer um padrão normal é que a variação individual é muito grande. Por isso, você pode até olhar para a tabela para ter uma ideia, mas o seu bebê é único, não tente enquadrá-lo nela e aprenda a observá-lo.

Faça um registro de uma semana sobre os padrões de sono do seu bebê, como: horário dos primeiros sinais de sono, hora que dormiu, quanto tempo fica alerta, sorrindo e feliz, você terá um número mais adequado para se basear e poderá ficar atenta para iniciar um ritual padronizado nesse momento para induzir o bebê ao sono mais fácil.

Rotina e Ritual do Sono

Agora que já temos bastante informação sobre o funcionamento do sono do bebê, podemos começar a parte prática. O primeiro passo é criar um ambiente e uma rotina favoráveis ao sono. Assim, a criança começa a ter associações que a induzem a pegar no sono e emendar um ciclo no outro sem precisar da sua ajuda em parte deles. Lembrando que estamos falando de bebês em desenvolvimento, então o seu objetivo não deve ser dormir a noite inteira sem nenhum despertar aos 2 meses, mas sim, o menor número de despertares e a maior autonomia possível dentro do que é esperado para a idade do seu bebê. Os passos a seguir resumem o básico para você começar:

Conheça seu filho e seus padrões: faça um registro durante 7 dias de informações importantes como: horário que teve os primeiros sinais de sono, horário que dormiu, como dormiu, onde dormiu, horário que acordou, motivo do despertar, horários da alimentação e atividades.

Ambiente seguro e confortável: deitar de barriga para cima, sem travesseiros ou protetores de berço e cobertor preso debaixo do colchão. Certifique-se de que o ambiente em que o bebê dorme seja tranquilo, escuro e confortável. Considere usar cortinas ou persianas para bloquear a luz do sol, um ruído branco para ajudar a abafar os ruídos externos e uma temperatura ambiente agradável para ajudar a manter o bebê confortável.

Estabeleça uma rotina: Tente estabelecer uma rotina de sono consistente para o bebê, incluindo horários regulares de dormir, se alimentar, brincar e acordar. É óbvio que existirão variações, afinal, sua casa não deve ser um quartel! Mas a sequência de atividades repetitiva traz previsbilidade e isso pode ajudar a estabilizar o ritmo circadiano do bebê e fazer com que ele se sinta mais descansado durante o dia. Exemplos:

  • Ao acordar, abra as janelas e deixe o sol entrar, estimule seu filho, faça passeios, o exponha à luz solar e aos sons do ambiente, fale e brinque bastante com ele. Tente manter uma rotina regular de horários da alimentação, atividades, sonecas e momentos de conexão com o seu bebê. Assim, se as suas necessidades de atenção, comida, sono e gasto energético/atividades forem bem atendidas durante o dia, a chance será menor de serem solicitadas à noite.
  • Induzindo o sono: fique atenta aos sinais de sono e às janelas de sono, ao identificar que já é hora da soneca ou sono noturno, inicie o ritual de sono: diminuindo a interação com a criança e leve-a para o ambiente do sono (quarto), escureça o local, ligue um ruído branco para abafar os sons externos, e faça as associações que desejar repetir sempre (cante uma música, ofereça o peito ou chupeta, dê uma naninha, nine no colo, dê tapinhas no bumbum, banho), e, de preferência, quando perceber que o bebê estiver sonolento o suficiente, coloque-o no colchão e dê a oportunidade dele tentar dormir sozinho.

E deixa eu te contar uma coisinha: isso tudo é lindo na teoria, mas na prática, você irá coloca-lo sonolento no colchão, ele irá acordar das primeiras vezes e você precisará acolhê-lo e recomeçar o processo (colo, peito, balanço) e repetir essa estratégia inúmeras vezes antes que ela funcione de maneira consistente. Durante esse processo, seja gentil com você e com o seu bebê, é super normal que eles tenham resistência a sair da zona de conforto de dormir no colo, no peito, etc.

Por isso, meu conselho é que você sobreviva do jeito que conseguir nos primeiros 1-3 meses do bebê, e quando sentir que ele está sentindo menos a exterogestação, relaxando mais rápido e com maior pressão de sono durante à noite, você teste começar essas rotinas e rituais. Se dermos a oportunidade com consistência, ele irá aprender e isso a ajudará a prolongar o sono por emendar um ciclo no outro.

Envolva outros cuidadores: Peça a participação do pai e outros cuidadores nesse momento, devido associação do sono com a mamada, é mais difícil para a mãe ter sucesso em colocar o bebê para dormir sem mamar. Lembrando que o bebê dormir mamando no seio materno é bem comum no primeiro ano de vida, e o leite materno tem melatonina e pode ajudar nesse processo de “aprender a dormir”.

Faça mudanças graduais: Se o bebê tem várias associações como cama compartilhada, só dorme mamando e no colo, tente modificar uma associação por vezes, e após cerca de 2 semanas dormindo dessa forma, é possível começar outra modificação. E, se possível, sempre comece a mexer nas associações do ritual do sono noturno para depois mexer nos despertares noturnos e sonecas. Isso porque o horário do sono noturno é o que a criança está mais cansada (maior pressão de sono) e poderá estar mais aberta a dormir de forma diferente.

Quebras de rotina: Lembre-se e aceite que qualquer mudança na rotina da criança, tanto no dia como na noite (como viagens, doenças ou saltos de desenvolvimento), poderá afetar o sono. Duas das principais regressões do sono acontecem por volta dos 4 meses, 6-7 meses e entre 9-12 meses.

Cuide de você: queixas de sono da criança estão relacionadas com maiores índices de depressão e ansiedade materna. Ainda não sabemos muito bem quem vem primeiro: o ovo ou a galinha. Portanto, perceba se você tem tido alteração de humor, apetite, irritabilidade, fadiga e peça ajuda! Crie sua rede de apoio para cuidar da criança e de você. Afinal, para cuidar de alguém você precisa estar bem.

Lembre-se de que cada bebê é único e o que funciona para um bebê pode não funcionar para outro. Se você estiver enfrentando problemas para melhorar o sono do seu bebê, converse com o pediatra para obter orientação e suporte individual.

Embora o processo de consolidação do sono noturno dependa do amadurecimento do cérebro do bebê, o ambiente em que ele vive influencia muito a maneira como isso irá acontecer.

Silveira Baratelli, Luciane. Sono Infantil Sem Neura (Portuguese Edition) (p. 29). Edição do Kindle.

Saiba mais:

Posselt, Kéli. Os pilares do bom sono infantil: Do recém-nascido à fase pré-escolar.

Ribeiro, Shirlei. Segredos para o bebê dormir: Um Guia Prático para o fim dos despertares na madrugada.

Silveira Baratelli, Luciane. Sono Infantil Sem Neura.

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29073398/#:~:text=Recommended%20sleep%20durations%20are%20as,8%2D10%20hours%20for%20teenagers.

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Dra. Jéssica Dantas
Pediatria, Gastroenterologia e Hepatologia Infantil. CRM 185972

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