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O Dilema das redes e o impacto na saúde mental das crianças.

Há pouco tempo a Netflix lançou um documentário chamado “O Dilema das Redes”, no qual especialistas da área de tecnologia por trás dos algoritmos das redes sociais explicam com detalhes esse “submundo” o qual frequentemente nos faz cair em engenhosas armadilhas para prender nossa atenção.

Mas porque falar sobre isso em um blog de pediatria? Vamos listar os motivos…

  1. O impacto na saúde mental das pessoas, principalmente os mais vulneráveis como crianças e adolescentes;
  2. A polêmica publicidade voltada ao público infantil pouco regulamentada nas redes sociais;
  3. A propagação de informações falsas que esse sistema alimenta, nos fazendo viver em uma bolha de desinformação;

Isso é normal ou será que estamos todos enfeitiçados?” Tristan Harris, ex-designer ético do Google.

Qual a mãe e/ou pai que nunca teve que disputar atenção com um dispositivo eletrônico nas mãos do filho (videogame, tablet, celular, etc) ? Essa realidade acontece todos os dias na maior parte das famílias e isso vem trazendo consequências graves nos aspectos de desempenho escolar, transtornos de humor, ansiedade, adolescentes com transtornos de percepção corporal ao realizar comparação com padrões de beleza inatingíveis e por fim, suicídio.

Mas será feitiço?! O que será que deixa nossas crianças (e nós adultos também né) tão ligados nas telas? As redes sociais são desenhadas para prender nossa atenção (cores, música, conteúdo) e isso ganha força com os algoritmos que ao acessar seus dados (sim, eles sabem TUDO sobre nós), vão ficando a cada dia melhor em te mostrar exatamente o conteúdo que você gosta, se tornando impossível desligar a tela.

Isso é pura psicologia aplicada, reforço intermitente positivo, para reforçar a bioquímica do nosso cérebro através da liberação de dopamina. Ou seja, manipulam a nossa atenção recompensando o nosso cérebro a cada hora perdida na frente da tela, passamos a querer mais daquilo, sem limites. Imagina se é difícil pra nós adultos termos controle, como ousamos imaginar que uma criança deve saber lidar com isso.

Queremos descobrir como te manipular psicologicamente o mais rápido possível para em seguida te dar uma injeção de dopamina” Chamath Palihapitiya

O segundo grande problema é relacionado a publicidade infantil, o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), já considera abusiva e ilegal a prática de direcionar publicidade ao público infantil, de qualquer tipo de produto ou serviço, em qualquer meio de comunicação ou espaço de convivência da criança. O Marco Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016) determina a proteção da criança contra toda forma de violência e pressão consumista e a adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica.

Mas temos absoluto controle disso por meio das redes sociais? E se um “youtuber” que o seu filho adora induzir um comportamento de compra? E se as informações do seu filho e gostos dele forem armazenados pelo algoritmo durante uma inocente busca pela internet e a partir daí gerarem uma série de anúncios disfarçados? São possibilidades que não podemos ignorar.

Saímos da era da informação para entrar na era da desinformação

E por fim, temos um modelo de negócio que lucra com a desinformação, amplifica os mitos e fofocas a um nível que é difícil distinguir o que é verdade ou não. Porque afinal, as redes sociais imitam e amplificam a vida como ela é. Informação verdadeira é chata, a audiência vai para os eventos trágicos superestimados. Se você é mãe e der uma busca no “local errado” por reação vacinal após o seu filho ter uma febre pós vacina, talvez comece a aparecer pra você sugestões de “artigos” e grupos anti-vacinas. Se a gente não se preocupar em confirmar a veracidade, caímos na ilusão de aceitarmos a realidade de mundo que somos apresentados.

Não me levem a mal. Não quero soar contra a tecnologia. Pelo contrário, sou fã, porque afinal temos grandes feitos relacionados a ela. Talvez só precisamos ser mais participativos e críticos no modelo ao qual a usamos e ao expormos as nossas crianças.

Estamos treinando uma geração a usar chupetas digitais para se acalmar quando esta entediada/frustrada e isso vai atrofiando nossa habilidade de lidar com as coisas.” Tristan Harris, ex-designer ético do Google.

O que posso fazer então?

  • Desative as notificações de todos os dispositivos da casa;
  • Use extensões, navegadores e portais de busca que combatem as recomendações sugeridas ou opte por navegação anônima.
  • Verifique as informações em várias fontes diferentes antes de assumir como verdade e compartilhar;
  • Ao se informar sobre saúde, acesse sites confiáveis como organizações de saúde (sociedade brasileira de pediatria, organização das nações unidas, etc) ou profissionais da área (verifique quem eles são também, seja crítico!)
  • Use o plano de mídia da AAP (Academia Americana de Pediatria): clique aqui.
  • Evite o uso dos dispositivos no quarto de dormir e n a hora da alimentação.
  • Evite exposição de mídias sociais na criança, de preferência, a exposição deveria ocorrer de forma consciente apenas na adolescência.
  • Combine com seu filho uma quantidade de tempo para uso dos dispositivos e redes sociais, os smartfones costumam ter uma função ou app para verificar o “tempo de uso”.

Lembre-se! seus cliques são “sua arma”, escolha bem pro que você dá atenção e consome.

Abraço,

Jéssica Figueiredo Dantas

CRM185972

Pediatria, Gastroenterologia e Hepatologia Infantil.

Fonte:Jenny Radesky, Yolanda (Linda) Reid Chassiakos, Nusheen Ameenuddin, Dipesh Navsaria and COUNCIL ON COMMUNICATION AND MEDIA Pediatrics July 2020, 146 (1) e20201681; DOI: https://doi.org/10.1542/peds.2020-1681

“O Dilema das Redes” – Documentário original Netflix.

https://criancaeconsumo.org.br/noticias/6-dicas-para-internet-segura-livre-de-publicidade-para-criancas/

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Dra. Jéssica Dantas
Pediatria, Gastroenterologia e Hepatologia Infantil. CRM 185972

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