Se você está aqui lendo esse texto, eu imagino que já tentou de tudo para cessar a cólica do seu bebê e como último recurso está procurando no Google mil hipóteses diagnósticas para justificar o que está acontecendo, certo? Eu ouço essa história quase todos os dias aqui no consultório. E espero, de verdade, poder sanar um pouco das suas dúvidas e aliviar um pouco do seu sofrimento.
O que é a cólica?
A cólica não é uma doença, mas é um transtorno para o bebê e toda a família, por isso dizemos que ela é um transtorno gastrointestinal funcional. Se caracteriza por um choro inconsolável e prolongado (aterrorizante), que se inicia e finaliza sem uma causa óbvia em um bebê que cresce e desenvolve normalmente.
Por que os bebês têm cólica?
Infelizmente a medicina ainda não consegue responder completamente essa questão. Acredita-se que a causa deva-se a soma de diversos fatores como: imaturidade do sistema nervoso central, possível grau de intolerância à lactose, anormalidades em hormônios gastrintestinais, alteração da motilidade, imaturidade intestinal, microbiota intestinal, tipo de alimentação da criança, dinâmica biopsicossocial da família, etc.
Existe remédio para tratar cólica?
Existem inúmeras promessas nas prateleiras das farmácias e na internet, mas até hoje não existe uma medicação promissora que traga a solução para a cólica. Na prática, só temos uma cepa de probiótico (L.reuteri 17938) que pode mostrar benefício em cerca de 50% dos casos (ou seja, nem todo probiótico ajuda também).
A alimentação da mãe pode dar cólicas no bebê?
Não basta a coitada da mãe está sem dormir, sem sair de casa, sem sequer tomar um banho decente, e o que acontece na primeira cólica da criança? Vai aparecer uma lista de alimentos proibidos baseados na opinião dos conselheiros de plantão. Nem um quadrado da barra do chocolatinho escapa. Mas a verdade é que apesar de existir essa crença popular, difundida inclusive por alguns profissionais e blogueiros, o fato que irei escrever em letras garrafais é que:
Sendo assim, na mesma linha de reflexão que fizemos da medicação, vale à pena aplicar uma restrição alimentar que provavelmente não ajudará e ainda vai atrapalhar a sua qualidade de vida, afinal comer é fonte de prazer (umas das poucas que você terá nessa fase inicial da maternidade). E se você estiver mais estressada, com fome, agitada, infeliz, será que o seu bebê não vai sentir e isso só pode piorar as coisas?
Claro que estamos falando de bebês saudáveis que foram avaliados por um pediatra que excluiu a possibilidade de alergia alimentar. Na alergia à proteína do leite de vaca, por exemplo, o bebê costuma ter cólicas intensas (além de outros sintomas) e a restrição alimentar da mãe que amamenta o bebê é justamente o tratamento! Mas não tende fazer esse diagnóstico sozinha, ok? Procure seu gastroped de confiança.
Sinais de alerta para investigar alergia alimentar no seu bebê:
- Dificuldade no ganho de peso
- Alterações no cocô (sangue, muco, diarreia, constipação)
- Assaduras de difícil controle
- Bebê com alergias respiratórias ou de pele
- Regurgitações em excesso
- Início após os 5 meses de vida
Como tratar a cólica?
Se seu filho foi avaliado por um pediatra de confiança e o diagnóstico foi cólica do lactente, o tratamento vai exigir de você muita paciência, amor e resiliência, repita o mantra “é só uma fase que meu bebê precisa mais de mim, vai passar”. Além disso, vou deixar algumas outras dicas que podem ajudar.
Reduzir a deglutição e produção de ar (gases):
- Acompanhamento da amamentação para ajuste de técnica e pega para o bebê engolir menos ar. Nos bebês que utilizam mamadeira, existem algumas mamadeiras que ajudam (mamadeiras anti-cólica).
- No bebê em uso de fórmula infantil, existem fórmulas no mercado que podem ajudar devido a melhor composição de prebióticos, proteína parcialmente hidrolisada e redução de lactose.
- Perceba se o bebê está com nariz entupido e respirando pela boca, se sim, faça lavagem nasal, pois ao respirar pela boca ele irá engolir mais ar.
Técnicas calmantes:
- Medidas de toque (amamentação, massagem, banho morno, bolsa de água morna, canguru, enrolar o bebê em um pano fazendo “charutinho”, ninho).
- Mude a postura: teste colocar o bebê para o lado esquerdo (ajuda a esvaziar o estômago) ou de bruços em cima de você. Se ele dormir, coloque-o no berço de barriga para cima.
- Evite a superalimentação, isso também pode deixar o bebê desconfortável. Se ele estiver regurgitando muito ou ganhando peso acima do esperado podem ser sinais de superalimentação.
- Chupeta ou chupar a mão; (A chupeta não é recomendada nos primeiros dias de vida se o bebê estiver amamentando por conta da confusão de bicos).
- Mude o ambiente e o movimente, leve o bebê para passear no carrinho ou no colo, ou coloque-o em uma cadeira-balanço, bola de pilates ou rede, ou ande com ele o balançando.
- Estímulo sonoro (ruído branco, batimentos cardíacos)
- Massagem no abdome e “bicicletinha”. Apesar de não existir evidência científica, em alguns casos a osteopatia pode ajudar estimulando com essas técnicas de movimento.
Alimentação da nutriz
- Consuma diariamente uma boa variedade de alimentos saudáveis (frutas, legumes, verduras e cereais integrais, boas proteínas magras). Limite o consumo de açúcares, gordura saturada e trans, processados e ultraprocessados. E se o bebê não tiver aplv, tome o seu leite na paz.
- Tome precaução com bebidas estimulantes que podem se associar à irritabilidade e insônia no bebê, tais como a cafeína (consumo máximo 300 mg/dia, uma xícara de 50 ml de café tem em média 100 mg) e chocolate (consumo máximo de 450 g/dia).
- Outros alimentos polêmicos: feijão, repolho, brocólis, cebola e alho são alimentos conhecidos como fermentáveis, mas não temos base científica para retirar da alimentação de todas as mães. Se por acaso você fizer uma relação importante com determinado alimento, teste o retirando da alimentação por cerca de 1-2 semanas, mas faça o teste com um alimento por vez e orientada pela sua pediatra.
Conheça você e o seu bebê:
- Faça um diário sobre a rotina do seu bebê e o conheça melhor. Verifique se o choro que você está interpretando como cólica pode ser sono, agitação, salto de desenvolvimento, fome, superestímulo, etc. O choro é a única forma de comunicação do bebê, então uma maneira de conhecer melhor suas necessidades é fazer essa observação atenta.
- Perceba também quando você estiver muito cansada e impaciente, isso vai deixar você com dificuldade de lidar com as demandas (mesmo que normais) de um bebê. Então se considere nesse processo, busque uma rede de apoio para cuidar de você e do bebê enquanto você não estiver bem. Entenda as suas necessidades, inclusive a de se afastar do bebê por alguns minutos ou horas que seja para se restabelecer. Nunca tente acalmar o bebê se você estiver impaciente. Dicas que costumam ajudar: acompanhamento psicológico, yoga, técnicas de mindfulness – existem alguns excelentes Apps que propões exercícios práticos voltados pros desafios da maternidade como o Gentle Bird e Headspace (esse apenas na versão inglês). Seja qual for a estratégia que você escolher, cuide-se!
Saiba mais:
https://www.sbp.com.br/especiais/pediatria-para-familias/cuidados-com-o-bebe/colica-do-lactente/
https://www.healthychildren.org/English/ages-stages/baby/crying-colic/Pages/Colic.aspx
Manual do MS “Amamentação e uso de medicamentos e outras substâncias”