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Alimentação infantil

Introdução alimentar do bebê: passo a passo.

Esse é um momento de euforia geral da nação. Bebê, vovó, mamãe e papai, até a pedi, todo mundo quer começar a introdução alimentar (IA) quanto antes. Entendendo que esse é um momento não só de introdução dos alimentos da perspectiva nutricional, mas também comportamental, e dependendo da maneira realizada vai impactar MUITO na relação do seu pequeno com a comida, você percebe a importância de investir em estudar e garantir um bom acompanhamento para a IA do seu baby. A ideia desse material é te ajudar nesse propósito, te passando um guia de como colocar a IA em prática:

Quando iniciar a IA?

Nem sempre foi assim, mas hoje, entendemos que o momento ideal é aos 6 meses (idade corrigida para os prematuros). E que além da idade, o bebê apresente sinais que está pronto para o processo de alimentação sólida (sinais de prontidão). Aqui vai um recadinho do coração para as vovós de plantão: “Sim, vovó, as coisas mudaram muito, e fico feliz que você esteja aqui para aprender a aplicar um modelo diferente do que você conhece e que foi muito estudado para ser proposto. Confie na pedi, nesse caso, as coisas mudaram para melhor.”

Mas por que devo esperar os 6 meses?

Com essa idade cronológica o bebê já costuma apresentar os sinais de prontidão, por ter maturação motora, funcional e cognitiva, além de certas enzimas digestivas começam a ser mais eficazes, as bactérias intestinais já estão instaladas e protegem o bebê de possíveis infecções, os rins começam a conseguir eliminar maiores quantidades de sódio e as defesas (sistema imunológico) estão prontas para entrar em contato com novos nutrientes e proteínas.

Oferecer a IA antes ou muito depois dos seis meses, pode expor o bebê a riscos como engasgos, desmame precoce, dificuldades e alergias alimentares.

Quais são os sinais de prontidão?

São sinais de desenvolvimento neurológico que deixam o bebê apto para a IA, como:

  • Conseguir sentar-se com pouco ou nenhum apoio, sustentando bem a cabeça e o tronco;
  • Perder o reflexo de esticar a língua para mamar, o que levaria a empurrar a colher para fora.
  • Curiosidade com os alimentos, mostra interesse e pega objetos os levando a boca, assim como abre a boca mais facilmente para provar novas coisas;

Na imagem abaixo, temos a ilustração da continuidade desse processo de alimentação do bebê, do nascimento até os 2 anos, para você ter uma ideia das principais etapas:

SBP, 2017.

Quais alimentos posso oferecer?

Para crianças sem nenhuma alergia alimentar, todos os alimentos frescos e naturais podem e devem ser oferecidos. Os cuidados serão mais relacionados com a forma de oferecer, com os cortes e consistências adequados ao desenvolvimento do seu bebê.

E se o bebê tiver alergia alimentar, o ideal é que se evite apenas o grupo alimentar que ele tem alergia. Por exemplo, se tiver alergia ao leite de vaca (aplv), você irá evitar o leite e seus derivados até que o gastropediatra e nutricionista dele o libererem para testar, mas todos os demais alimentos, inclusive outros potenciais alergênicos (ovo, peixe, trigo) devem ser oferecidos na janela imunológica de 6 a 9 meses.

Quais alimentos devo evitar?

  • Alimentos que tenham um risco maior de engasgo: alimentos redondos ou em formato de moeda, de consistência endurecida, pipoca, oleaginosas;
  • Alimentos processados e ultraprocessados (veja a explicação abaixo);
  • O mel deve ser evitado até um ano pelo risco de botulismo;
  • Sal até um ano de vida e açúcar até os dois anos.
  • Evitar suco de fruta até um ano, preferir oferecer sempre a fruta in natura.
  • Os derivados do leite podem ser introduzidos após os 9-12 meses. A SBP recomenda que o leite de vaca em si só deve ser introduzido a partir de um ano.

Desembale menos e descasque mais, e você estará no caminho certo de uma alimentação saudável.

Entendendo a classificação dos alimentos:

Naturais

São alimentos frescos, sem qualquer alteração. Ex: frutas, batata, ovo.

Minimamente processados

São alimentos que passam por um processo de limpeza, entre outras etapas, mas que não tem adição de outra substância como açúcar, gordura, sal e aditivos. Ex: arroz, feijão, legumes congelados, frutas secas, etc.

Processados

Os processados são os alimentos que sofrem adição de algum ingrediente. Ex: conserva de legumes, molhos prontos, pães, etc.

Ultraprocessados

Os ultraprocessados, como o nome já sugere, levem vários ingredientes extras na sua composição (açúcar, aditivos, sal, aromatizantes, etc). Ex: salgados de pacote, refrigerante, bebidas prontas, sorvete, gelatina. Na dúvida utilize a regra dos 5, tem mais do que 5 ingredientes, é ultraprocessado.

Qual o melhor método para a IA?

Aquele que você e a sua família se sentem mais seguros para aplicar. Vou explorar um pouco dos métodos a seguir:

Tradicional com enfoque participativa

  • O bebê é alimentado pelo adulto com colher, mas de forma encorajadora, respeitando a fome do bebê.
  • Apresente a comida na colher, mas só a oferecer se ele vier até a comida ou abrir a boca. Não forçar!
  • A evolução da consistência deve ser gradual (pastosa, papa e purê);
  • A refeição deve ser amassada, sem peneirar ou liquidificar;
  • A partir de 8 meses a criança pode receber os alimentos da família amassados, triturados, desfiados ou cortados em pequenos pedaços;
  • O bebê pode e deve ter a oportunidade de pegar os alimentos em pedaços para se alimentar também.
Ministério da Saúde, 2021. GUIA ALIMENTAR PARA CRIANÇAS BRASILEIRAS MENORES DE 2 ANOS. Evolução das consistências na IA.

Baby-Led Weaning (BLW)

Conceitualmente, a idealizadora, a britânica Gill Rapley, defende a oferta de alimentos
complementares em pedaços, tiras ou bastões.

Sua abordagem não inclui alimentação com a
colher e nenhum método de adaptação de consistência
para preparar a refeição do lactente, como amassar, triturar ou desfiar. Além disso, o método sugere que os pais:

  • Permitam que o lactente se suje e interaja durante as refeições;
  • Ofereçam variedade de alimentos, evitando a
    monotonia;
  • Procurem interagir com o lactente quando ele estiver
    comendo junto, durante as refeições;
  • Deem o tempo necessário para a refeição sem
    pressionar;

Esse método costuma ajudar as crianças a estimularem o seu desenvolvimento motor, autorregulação da ingestão alimentar e trabalha a confiança do bebê e da família dentro desse processo de alimentação. Existem alguns estudos propondo que esse método está ligado a um menor risco de obesidade futura.

Baby-Led Introduction to SolidS (BLISS) – Introdução aos Sólidos Guiada pelo bebê

É uma proposta de um grupo de estudiosos neozelandeses que foi criada para diminuir as preocupações dos pais e dos profissionais de saúde relativos ao BLW, como risco de engasgo, e de baixa oferta de ferro e de calorias. Podemos dizer que ele é uma versão adaptada do BLW.

  • Oferecer alimentos cortados em pedaços
    grandes, que o lactente consiga pegar sozinho;
  • Garantir a oferta de um alimento rico em ferro
    em cada refeição
    (carne, feijão, ovo, verduras de cor verde-escura);
  • Ofertar um alimento rico em calorias em cada
    refeição
    (cereais, tubérculos, azeite, abacate, óleos vegetais);
  • Oferecer alimentos preparados de uma forma que reduza o risco de engasgo e evitar
    os alimentos listados como
    alto risco de aspiração

Nessa aula (maravilhosa) da minha nutri favorita: a Dra. Ana Paula Cortez, dá exemplos de cortes conforme o desenvolvimento motor da criança, fazemos cortes em tiras maiores que a prensa da mão até cerca de 9 meses, e após isso cortes circulares menores para a pinça, mas o tamanho seguro deve ser maior do que o punho da criança.

https://www.youtube.com/watch?v=s4IFC3L-Nt8

Outra dica é baixar o app do Blwbrasil. Sem conflito de interesses (não ganho nada por essa publi gratuita), mas acho o que o app cumpre bem a proposta de facilitar a orientação dos cortes e da introdução alimentar pelo método BLW/BLISS.

É importante saber que não existem evidências de que o método tradicional com colher seja menos estimulante ou menos importante, desde que sejam seguidas as orientações nutricionais e comportamentais para IA da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Ministério da Saúde (MS) e Organização Mundial de Saúde (OMS). Vamos explorar mais elas no tópico a seguir:

Por qual alimento devo começar?

Tanto faz! Tradicionalmente os bebês são mais aptos ao sabor adocicado, principalmente os em aleitamento materno exclusivo, por isso damos preferência para o início com as frutas. É importante quebrar o mito que você precisa esperar 3 dias após a introdução de um alimento para introduzir outro. Isso só é válido para crianças com forte suspeita de alergia alimentar dos alimentos que estão sendo introduzidos.

Como montar o prato?

Sempre que possível, o prato deve conter um representante de cada grupo alimentar abaixo:

Fonte: SBP, 2022. Guia prático de alimentação. Crianças de 0 a 5 anos.
Ministério da Saúde, 2021. GUIA ALIMENTAR PARA CRIANÇAS BRASILEIRAS MENORES DE 2 ANOS. Evolução das consistências na IA.

ATENÇÃO!
O leite materno continua sendo importante e a amamentação deve continuar até 2 anos de idade ou mais.

Sugestão de cardápio

Crie uma rotina de alimentação, tentando oferecer as refeições sempre nos mesmos
horários conforme esquema alimentar abaixo. Perceba que essa rotina vai gradualmente mudando em termos de quantidade de alimentos sólidos e refeições por dia. O leite materno (ou fórmula infantil) ainda está bastante presente no cardápio, já que a introdução alimentar sólida é complementar, e não substituta. Ao completar 1 ano, além do leite materno, a criança já deve receber cinco refeições por dia e estar no cardápio da família.

Ministério da Saúde, 2021. GUIA ALIMENTAR PARA CRIANÇAS BRASILEIRAS MENORES DE 2 ANOS. Evolução das consistências na IA.

Preciso oferecer água?

Sim! Agora seu bebê precisa de água, então anota aí a dica de quanto ele precisa
ingerir por dia:

0-6 meses: 700ml, se a criança estiver em amamentação exclusiva não precisa tomar
água.
7-12 meses: 800ml
1-3 anos: 1300ml
Obs: Se a criança estiver em uso de fórmula infantil ou aleitamento materno, a quantidade ingerida contribui para o cálculo da ingesta hídrica.

Ofereça água em copos pequenos, copos de transição ou copos com bicos. E estimule a criança a segurar o copo sozinha.

Reflexo de GAG e Engasgo

Se você estiver desavisado e presenciar um episódio de GAG, pode ter um baita susto e criar uma falsa emergência na sua cabeça. Então vamos conhecer a diferença entre GAG e Engasgo: o reflexo de GAG é um reflexo protetor contra o engasgo. Quando o GAG acontece, a criança aciona o fechamento da passagem para a via aérea e direciona o alimento para o caminho certo (via digestiva) ou acaba vomitando o conteúdo. Na maior parte das vezes, o susto passa e a criança segue a vida como se não tivesse acabado de causar um infarto na família. Por vezes, a criança pode também ficar irritada, chorosa, assustada, normal, né?! O engasgo ocorre quando o alimento vai para o caminho errado (via respiratória) e então bloqueia a passagem de ar.

Sinais de engasgo

  • A criança ter uma mudança na cor (roxa ou muito avermelhada);
  • O bebê não consegue chorar ou respirar (engasgo total). Ou seja, se está chorando, está respirando!
  • Presença de um acesso de tosses com respiração ofegante (engasgo parcial)
  • Você percebe a criança desfalecendo, sem reação.

Se isso acontecer o que eu faço?

  • Grite por ajuda.
  • Aplique a Manobra de Heimlich.
  • Ligue para o Corpo de Bombeiros telefone 193 ou SAMU telefone 192 e diga seu endereço: nome da rua, número da casa, nome do bairro e a cidade onde está.

Resumão com 8 regras de ouro para a IA

  1. Comer junto e não dar de comer: proporcionar um ambiente tranquilo com refeições em família, incentivando a interação entre os membros da casa e deixando a criança explorar os alimentos, independente do método aplicado. Jamais distraia a criança da alimentação com telas, por exemplo.
  2. Seja exemplo: lembre-se que se você não come frutas e legumes, dificilmente seu filho comerá.
  3. Respeitar as responsabilidades de cada um no processo de alimentação: pais – escolher a comida, quando a comida será servida e onde a refeição será feita; criança – decidir o que e o quanto vai comer. Conheça e respeite os sinais de fome e saciedade do seu pequeno.
  4. Ofereça diversidade na alimentação, priorizando alimentos frescos, saudáveis e da safra. Monte o prato, sempre que possível, selecionando um alimento de cada grupo alimentar;
  5. Utilize sabor na alimentação: a alimentação é uma experiência sensorial, preze por temperos naturais como salsa, cebolinha, alho, cebola, coentro, manjericão, orégano,
    tomilho, páprica, etc. Para refogar os alimentos dê preferência para o azeite de oliva (virgem) e para temperar ou colocar em cima da comida, o extra-virgem.
  6. Atente para a segurança: lembrar de lavar bem os alimentos antes de oferecer para consumo. E ensine as crianças a lavar as mãos antes e escovar os dentes após. Preste atenção na postura e sempre garanta que um adulto esteja próximo para o auxílio. Evite os alimentos com risco de engasgo.
  7. Seja consistente. Não assuma que a criança não gosta de determinado alimento, pois ela recusou. Algumas vezes, são necessárias de oito a dez tentativas para que a criança aceite o novo alimento. Varie o preparo, a forma de apresentar ou temperar e continue oferecendo.
  8. Seja paciente. Tolere a bagunça, torne o momento divertido para vocês, foque mais no processo (contato com o alimento) do que no resultado (comer). Lembre-se que o comer é o final de um processo de tolerar, cheirar, tocar, experimentar e gostar. Permita-se viver o processo!

Davi se esbaldando na pitaya <3

NÃO CRIE EXPECTATIVA QUE O SEU FILHO COMA TUDO QUE
OFERECER! INCLUSIVE É MUITO PROVÁVEL QUE ISSO NÃO
ACONTEÇA! O IMPORTANTE NESSE MOMENTO É OFERECER E
GERAR A OPORTUNIDADE PARA PROVAR DIVERSOS SABORES
E ALIMENTOS

Ana Paula Cortez (Nutricionista da clínica Gastroped)

Saiba mais:

https://www.sbp.com.br/especiais/pediatria-para-familias/nutricao/quando-introduzir-novos-alimentos-para-o-bebe/

https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/19491c-GP_-AlimCompl-_Metodo_BLW.pdf

https://www.espghan.org/knowledge-center/publications/Nutrition/2017_Complementary_Feeding

https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderneta_crianca_menino_2ed.pdf

http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_alimentar_2anos.pdf

https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/ALIMENTACAO_COMPLEMENTAR_MS.pdf
Picture of Dra. Jéssica Dantas
Dra. Jéssica Dantas
Pediatria, Gastroenterologia e Hepatologia Infantil. CRM 185972

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